Yoga e saúde: uma relação íntima

Um dos grandes contributos dos mestres da Índia antiga é o Yoga, que muitas pessoas encaram como uma forma de vida e uma filosofia prática no caminho da espiritualidade. Por outro lado, muitas pessoas são atraídas para o yoga porque procuram uma solução para muitas doenças e aflições da vida moderna. Neste contexto, o yoga é considerado não somente uma disciplina prática que promove a saúde e evita doenças, mas é também amplamente reconhecido como uma terapêutica complementar usada em grandes hospitais e centros de terapia na Índia, nos Estados Unidos e em Inglaterra, onde diversos centros de investigação estudam os benefícios do Yoga na saúde. 

Como compreender esta situação?

Como é que uma filosofia é também uma prática terapêutica e uma estratégia de estilo de vida, a incluir numa rotina diária tal como lavar os dentes ou alimentar-se adequadamente? 

O Yoga teve origem na Índia como resultado do pensamento de grande pensadores e sábios que exploraram diversos aspectos da vida e formularam ideias e práticas a partir de buscas que visavam a compreensão da natureza e dos fenómenos que nela ocorrem, do Homem e daquilo que se relaciona com a vida e a morte. Este conhecimento acumulado foi sistematizado por Patañjali numa obra intitulada Yoga Sūtra, que constitui o texto base do chamado Yoga Clássico e apresenta o Yoga como um fim – o estado último de liberdade (moksha), e também como um meio para o alcançar. Enquanto caminho, Patañjali descreve o chamado Yoga de oito partes (Ashtanga Yoga) que inclui

  1. valores éticos e morais (yamas),
  2. normas de conduta (nyamas),
  3. posturas psicofísicas (asanas),
  4. técnicas respiratórias (pranayamas)
  5. abstração dos sentidos (pratyahara),
  6. concentração da atenção (dharana)
  7. meditação (dhyana)

e, como culminar deste processo,

  • o estado de êxtase (samadhi), que se atinge quando a mente está completamente tranquila e a consciência é plena.

Nestas oito etapas, as primeiras quatro tratam do corpo físico, uma condição necessária para que as últimas trê etapas, que se centram sobre aspectos mais subtis, possam ser conquistadas. O caminho do Yoga vai, assim, num crescendo, do denso para o subtil através do autoconhecimento. A compreensão dos conceitos corpo e mente teve início na tradição filosófica e Patañjali fala sobre a importância de uma relação harmoniosa entre o corpo físico, a respiração e a mente, mas este não é o foco principal da filosofia. Todas as práticas de Yoga trabalham o corpo, a respiração e a mente com o objectivo de os preparar e aperfeiçoar para a busca espiritual que se completa nos estágios finais do Yoga. O que se adquire neste processo é um estado que a ciência comprovou estar associado a uma maior quantidade de ondas gama, isto é, de oscilações electromagnéticas que estão associadas à percepção da consciência, da atenção, da memória, da inteligência e do autocontrolo emocional (sensações de bem-estar e felicidade).

Na corrida desenfreada para mostrar os aspectos benéficos do yoga na saúde e a sua natureza terapêutica, são frequentemente relegados os seus fundamentos, realçando-se exclusivamente a sua componente física, mas o yoga não pode ser limitado a isso. As ideias filosóficas sistematizadas por Patañjali oferecem os princípios básicos para se trabalhar na saúde mental e no processo de transformação que é essencial para a saúde psicológica.

A saúde é considerada a um nível multidimensional e o Yoga oferece meios para lidar com as aflições em cada nível. Ao nível físico, o asana é uma ferramenta útil. O controlo da respiração, através de pranayama prepara a mente para a meditação, que por sua vez treina e disciplina a mente e os sentidos. O entendimento e a aplicação da disciplina pessoal e social oferecem suporte nas dimensões pessoal, social e ambiental da vida. A saúde não se restringe, portanto, ao corpo e à mente. A saúde espiritual e o bem-estar formam a base da saúde global que é considerada, hoje em dia, uma dimensão importante no contexto da qualidade de vida. A espiritualidade não é só um recurso íntimo, mas uma condição para um estado de saúde melhor e o Yoga, sendo uma forte tradição filosófica com foco na espiritualidade, visa também esta dimensão. A aproximação holística à compreensão da natureza humana em termos de múltiplas dimensões que interagem – corpo, respiração, mente, conhecimento discriminativo, vizinhança social e ambiental, e a consciência profunda – formando um princípio dinâmico interdependente, é a maior contribuição do Yoga e não pode, em nenhuma circunstância, ser minorada.