Aceitar e Agir acertadamente

Kshanti, Karma e Dharma

Aceitação é um termo que em Português pode ter duas conotações diferentes. Se, por um lado, aceitar significa receber o que é oferecido, concordar ou aprovar, a palavra aceitação nem sempre tem uma conotação positiva, sendo frequentemente empregue com o significado de resignação, isto é, aceitação sem escolha ou contra vontade.

No Sânscrito, a palavra kshanti (kṣānti), que se traduz por aceitação, não tem conotação positiva nem negativa. Simplesmente traduz aceitação, sem júbilo, mas também sem esforço ou contrariedade. Kshanti traduz a aceitação ou acomodação às coisas e às situações tal como elas são ou se nos apresentam. Traduz o reconhecimento de que não temos controlo sobre alguns acontecimentos, e que estes não ocorrem para nos agradar ou desagradar. Independentemente dos juízos que fazemos sobre as circunstâncias, temos que aceitar que não temos modo de as alterar. O momento que vivemos agora mostra, de forma muito clara, que é assim. É preciso que compreendamos que uma pandemia causada por um vírus, embora coloque dificuldades presentes e futuras, não acontece para nos contrariar nem combater e, por isso mesmo, não é com atitudes de rejeição ou de irritação que podemos fazer-lhes frente. A inflamação do nosso ego, que se recusa a aceitar que a vida não está sob o nosso comando, pode ser o nosso maior inimigo, porque nos deixa cegos e incapazes de agir com lucidez.

Está na hora de aplicar kshanti e de acalmar os juízos egocêntricos, que tudo classificam como bom ou mau, certo ou errado. É agora o tempo de aprender. Fazer frente a dificuldades e a contrariedades é uma oportunidade para crescer, para nos frontalizarmos com a transcendência e reconhecermos que mesmo que nos pareça que tudo se está a desmoronar, a vida continua. Não significa isto que não tenha importância reconhecer o sofrimento e que esse possa ser minimizado. É preciso ser solidário, ser compassivo e minimizar o sofrimento pessoal e de todos. Mas para o fazer, é preciso deixar de lado as certezas e convicções individualistas, aceitando a vida e continuando a fazer aquilo que está certo ou, usando as palavras do sânscrito que traduzem estes conceitos, cumprindo o karma, o que devemos fazer, segundo o dharma, em consonância com os valores Universais. Se retirarmos das dificuldades que se nos colocam hoje a capacidade de relativizar e enquadrar o presente num contexto mais amplo que nós próprios, sairemos mais preparados para fazer frente à vida e perceber  que as estações do ano se sucedem, a energia continua a fluir e é nesse fluxo que encontramos o nosso lugar.